ANATOMIA DO MENINO ESCONDIDO
Carrego no bolso furado da jaqueta um estilingue quebrado. Vim da infância armado de iniciativa, com os olhos brilhando, levantando a cara antes da aurora.
Eu sei, você corre à minha frente. A coragem suja dos pés descalços rasgando o chão do mundo. O salto antes do abismo ter forma, a mão suja de barro e desejo abrindo caminho na carne crua do mundo.
Fantasma risonho que me acena do outro lado da rua, reflexo distorcido no vidro das vitrines vazias. Ainda sinto no rosto o peso do sol que nos caía como bênção e sentença, a alegria sem nome que explodia em gargalhadas entre as ruínas das tardes.
A fome da atitude agora corre nas veias, como se o universo ainda fosse um quintal aberto, cheio de maçãs e pecados. Eu ainda sou aquele que levantava o punho, que sonhava com um anjo gritando versículos de Lautreamont nas ruas.
E eu te sigo à distância, perdido entre a periferia do meu ser e a imensidão suja desse mundo ordinário. Ainda feito de sol e ferida, erguendo as manhãs com o peito aberto, sem saber do risco — sem querer saber.
Eu sigo — não descanso.
Eber S. Chaves
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