OS PISTOLEIROS QUE ESQUECERAM AS BALAS
O sol alto, o céu branco. O horizonte tingindo em vermelho a paisagem árida, infinita; e uma linha de calor ondulando ao longe. Mick e Sam, lado a lado, cavalos se movem no silêncio seco, chapéus caídos, mãos perto dos coldres, balançando com o ritmo do vento.
Sim, eles eram pistoleiros! O som do couro rangendo, botas que ecoavam como trovão — se ao menos conseguissem caminhar em linha reta. "Homens perigosos!" — sussurrava a lenda. Sacavam mais rápido que a própria sombra (dizem!). Da última vez que erraram o alvo, a cinco passos, culparam o calor do deserto.
À frente, eles avistam o saloon — madeira desbotada, estacas que se erguem como ossos velhos, esqueletos à espera de algo mais que vento e poeira. Chumbo Louco Johnson, nome que pesa, ferro batido em sangue seco, os aguarda ali, como um cão à porta, pesado e imóvel.
A estrada até o saloon não perdoa passos lentos, não há sombras que salvem, apenas o sol, que corta a distância com lâminas de luz, ferindo o olho, cegando a verdade. Adiante a porta range, o som se arrasta como um lamento antigo, ferrugem e pó em cada dobradiça, suspense pendente no ar quente. A luz dourada entra pelas janelas empoeiradas, o ar ali é pesado com o cheiro de tabaco e suor. O som de passos ecoa no assoalho gasto. Mick e Sam entram.
Numa mesa isolada, Chumbo Louco Johnson estava sentado. Não havia movimento em seus músculos. Ele era um bloco de força contida; os olhos escuros, profundos, imóveis; os braços cruzados. Uma montanha silenciosa no meio da tempestade que se formava.
“Aquele é o cara?” — Sam pergunta com o olhar. Mick responde após um suspiro. Aquele era o encontro onde seus destinos se desenrolariam, ou pelo menos, onde eles tentariam não tropeçar antes de chegar à mesa.
Sentaram-se numa mesa no meio do saloon, o pó da estrada ainda grudado nas botas. Mick, o mais velho, o mais cansado, ajustou o chapéu com um gesto lento, quase épico. Sam, jovem e tolo, de repente pálido como um fantasma, falou: As pistolas! As pistolas estão vazias! Ele olhou para o coldre, olhou para Mick, e a ironia afundou no seu peito.
Não carreguei as pistolas, Mick! - Sam tornou a falar.
Mick o encarou com olhos cheios de poeira. O suor rastejava-se sobre sua pele. “O que se faz com pistolas vazias? Fulgor da pólvora, estrondo da morte. Que é um pistoleiro sem balas, dizei-me?” — ele respondeu a Sam.
“Desgraça! Em que momento de descuido o chumbo precioso, vital sustento de nossas mãos sedentas de vingança, fugiu-nos da memória e dos coldres? Pistoleiros somos, e contudo, vazios” — refletiu Sam.
No saloon, o xerife de cara cansada da janela observa tudo, impassível, levantando o chapéu, coçando a cabeça. Em frente a eles, o barman Joe, seco como a madeira dos balcões, lavava copos eternamente, com gestos automáticos.
Chumbo Louco Johnson continuava imóvel, mas sua presença se tornava mais opressiva, como se o ar ao redor dele estivesse sendo consumido. Os músculos sob a camisa apertada estavam tensos, prontos, mas ele não se movia, não havia pressa. A calma antes da explosão.
O silêncio se esticava, gole amargo de espera. Os pistoleiros com olhos fixos no nada. Suas mãos flutuavam sobre os coldres. O ar parecia suspenso. Chumbo Louco Johnson finalmente moveu os olhos, um gesto mínimo, mas com o peso de uma decisão fatal. O mundo parecia inclinar-se para ele, a inevitabilidade de um destino desenhado em sangue e poeira.
E agora? — Indagou Sam, assustado.
Faz o som de tiro com a boca — disse Mick, segurando uma pistola dourada, tão imaginária quanto sua coragem.
BANG! — Gritou Sam com voz triunfante, quase heroica. Um trovão encenado por uma boca cheia de ar, uma explosão de inexistência, saída de uma pistola de imaginação defasada.
De repente, os dois começaram a fazer gestos dramáticos, apontando as armas vazias para todos os lados e gritando “BANG!” repetidamente com fúria insana. As cadeiras rangeram enquanto eram derrubadas. As mesas balançaram. O público ao redor, todos bêbados, uma coletividade de corpos enfadonhos, explodiu em gargalhadas como uma legião de hienas em uma orgia de escárnio. O xerife sentado no canto, próximo à janela, segurava a barriga enquanto gargalhava, lágrimas escorrendo pelos olhos, o chapéu caído sobre a testa. Até Chumbo Louco Johnson ria histericamente. A morte também ria, pois não havia quem a chamasse.
Eles estão se matando! Estamos todos mortos! — gritavam ironicamente os bêbados.
Quando o último BANG! se desintegrou no vazio, e o barulho das risadas cessou, não havia mais nada a esperar, nada a invocar, apenas o resíduo de uma cena que se desvanecia, como um sonho em um deserto de ironia e silêncio.
Em meio à ebulição e tumulto, Mick e Sam fugiram do saloon como loucos. As portas se estiraram, com suas dobradiças resmungando, suspensas no limbo entre o fora e o dentro. À frente, à frente! — gritava Mick, gesticulando freneticamente, como se estivesse comandando um exército em retirada.
Para onde? Para onde vamos, Mick? — disse Sam.
Para a vitória, não para o além! — gritou Mick.
Do lado de fora, o deserto os esperava. O vento bateu em seus rostos como um tapa fantasmagórico. Montaram em seus cavalos e correram em direção ao nada, até suas silhuetas desaparecerem no horizonte.
Os pistoleiros cavalgavam, cavalgavam - com expressões sérias, pistolas sem balas, corações vazios. Chumbo Louco Johnson! Ele ainda estava lá dentro do saloon! Esperando, sempre esperando!
Fade out. (Ao fundo, a trilha sonora The Surrender - La Resa, de Ennio Morricone). A câmera se afasta, a poeira ergue-se, engolindo tudo. O som de um "BANG!" ecoa de novo, mas ninguém sabe de onde veio.
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